Sobre o filme "Não fale o mal" e a incapacidade de dizer um simples NÃO
e todas as encrencas que isso pode te levar
Recentemente, assisti ao filme “Não fale o mal” com o meu marido, sem ter nem ideia do que se tratava, apenas que era remake de um filme dinamarquês. Julgando pelo título, achamos que se tratava de um filme de terror, algo sobrenatural, talvez com uma vibe meio religiosa. Nos enganamos e, no fim das contas, o filme é simplesmente sobre a incapacidade das pessoas de dizer um mero “não”, bem dito, na cara de gente inconveniente.
Se você não assistiu e pretende assistir, recomendo que leia este texto somente depois, porque é possível que eu solte algum spoiler sem querer. Se já assistiu ou não pretende ver mesmo, fica aqui pela análise mesmo, que eu juro que tem como relacionar esse filme com o nosso prazer.
Como já adiantei, o filme não é exatamente de terror, mas é sim um belo dum suspense e nós gostamos (até me manteve acordada depois das 22h, isso é bem difícil). Porém devo ressaltar que o filme dá raiva! Muita raiva. Dos “mocinhos”, é claro, porque você fica se perguntando o tempo inteiro como eles podem ser tão burros! Para contextualizar, basicamente se trata de um casal com uma filha pré-adolescente que conhece outro casal com um filho quase da mesma idade quando estão todos numa viagem, na Itália. Como todos moram na Inglaterra, eles combinam de manter contato e esse segundo casal convida o primeiro para passar uns dias no sítio deles, em algum condado na área rural. O marido se empolga com a ideia, enquanto a esposa acha tudo meio estranho… claro que ela concorda com ele, para vê-lo feliz.
Durante a tal viagem, logo no começo eles se deparam com diversas situações incômodas onde poderiam apenas contrariar seus anfitriões e impor alguns limites básicos (a mulher vegetariana chega a comer carne, só pra agradar - apenas um exemplo), mas preferem ficar quietos para “não criar um climão”, sabe como é. E as situações ficam cada vez mais esquisitas e desconfortáveis, até que chega num ápice, acontece algo ABSURDO (esse spoiler eu não vou dar, mas se alguém quiser saber, me pergunta nos comentários) e a mulher decide ir embora na hora, em plena madrugada.
Estaria tudo ótimo, maaaaas… a filha do casal esqueceu o bichinho de pelúcia dela na casa! O bichinho já era uma questão entre eles, o pai dizia que ela já estava muito velha pra isso, enquanto a mãe apaziguava. Essa menina faz um escândalo por causa do raio do bichinho e, adivinha? Eles decidem voltar para buscar, a família anfitriâ acorda, explicam o suposto mal entendido da madrugada e meio que fica tudo bem, eles decidem permanecer mais tempo na casa, ignorando todos os sinais de alerta.
Depois disso, a tensão chega no auge, mas não vem ao caso, isso aqui não é uma análise do filme; é uma crítica à nossa necessidade de agradar a qualquer custo. Mesmo quando nossos instintos nos avisam, mesmo quando machuca, mesmo quando é visivelmente loucura. E adivinha quem mais tem a tendência de calar para agradar? Mulheres, é claro.
Eu me considero alguém que aprendeu, à muito custo, dizer o tal do não. Eu era aquela pessoa que aceitava tudo, não questionava, tudo sempre estava bom - não estava, concordava com fazer muito mais do que o meu trabalho, assumia mais responsabilidades do que dava conta, me desdobrava em mil para deixar todo mundo feliz. Isso só me deixou sobrecarregada e esgotada - e até um pouco ranzinza, porque hoje dizer não virou algo quase automático, raridade é eu responder que sim!
Perdi a conta de quantos rolês eu fui com zero vontade, quantas caronas eu dei mesmo estando atrasada e o quanto de funções acumulei em alguns dos meus trabalhos, só porque negar algo parecia inconcebível. Muita terapia depois, entendi muito mais a minha necessidade de agradar os outros, que na verdade tem mais a ver com não querer ver ninguém sofrendo, então eu preferia pegar o sofrimento para mim. Resolvi parar de sofrer e teve gente que se doeu tanto com minhas negativas que perdi algumas amizades. Livramento? Pois é.
O que eu quero dizer é que, se eu consegui, você também consegue, caso tenha se identificado com a Letícia de alguns anos atrás. É. Só. Dizer. Não. Sim, as pessoas podem ficar chateadas. Sim, vai ter gente que não vai gostar. Não, você não vai ser a funcionária preferida do seu chefe. Sim, sua mãe pode lidar com suas recusas, ela já é bem grandinha. E você vai agradar a pessoa mais importante do seu mundo: você!
Muito bem, quero que você passe a priorizar suas vontades na vida num geral, mas eu falo de prazer, né? Então vamos lá: no sexo, você diz sim pra si própria? Ou tá mais preocupada em agradar a pessoa que tá ali com você?
Não existe nada mais gostoso do que o prazer genuíno e sincero, só que ele não existe quando você tá ali, preocupada com o seu corpo ou com a sua performance. Ele também não vem se você concorda com coisas que te deixam desconfortável na cama (ou fora dela). E ele fica limitadíssimo se você não expôe ao outro os seus desejos e fantasias!
Por isso te desejo corageeeeeem!
Coragem de desagradar mesmo. De se soltar no sexo, deixar seu corpo fazer os movimentos e os sons que ele precisar, mesmo se sua barriga ficar com dobrinhas e você parecer um bicho grunhindo. De dizer que não, você não quer fazer (insira algo que você não gosta aqui) porque não te dá prazer, ou porque te machuca. E, principalmente, de contar suas vontades, mesmo que sejam consideradas um tabu (exemplos: sexo anal, sexo à três, BDSM, role play….), mesmo que vocêe ache que sua parceria vai te olhar com olhos arregalados de espanto. Vai que a sua pessoa tem as mesmas vontades que você e você nem sabe!
A vida fica infinitamente mais bonita quando nos assumimos por inteiro. Quando impomos limites onde faltam limites e quando ampliamos os horizontes onde precisamos de mais espaço. Confia. E depois me conta, é claro.
Essa reflexão fez sentido por aí? Então que tal compartilhar com alguma amiga que também vai gostar de ler?
Vamos assistir ao filme então?
Esse foi o responsável pela reflexão:
O filme é de 2024 e você pode alugar no Amazon Prime (ou achar por aí na internet).
Se gosta de suspense, de ficar vidrado na tela e de passar raiva, é pra você. Mas devo admitir que não é nenhuma revolução cinematográfica não; gostei, mas não muda a vida (aprender a dizer “não”, isso muda a vida)
O original:
É um filme dinamarquês de 2022 e pela minha pesquisa está disponível num streaming chamado Reserva Imovision (não conheço).
Não assisti ao original, não sei nem se me traria a mesma reflexão, mas boatos que o final é beeeeem diferente e que a trama se desenrola de maneira ainda mais tensa! Estou cogitando assistir, adoro que fora de Hollywood os filmes são de uma forma geral mais crus, realistas, sei lá. Hollywood normalmente doura a pílula.
Você já assistiu? Me conta se vale a pena!
Voltei!
Apesar de me organizar ao máximo para não parar com a newsletter durante meu pseudo recesso, fiquei devendo por algumas semanas. Agora já estou de volta e não sei se garanto a frequência semanal das Reflexões de prazer e dos Contos eróticos, mas saibam que estou dando o meu melhor aqui - porque escrever só por escrever e cumprir tabela não faz meu estilo, gosto de ter o que compartilhar.
Obrigada a todos que acompanham!
O que você sentiu ao ler esta reflexão? Deixe um comentário, tô doida pra saber!
Passei raiva só de ler. Me conta o ápice absurdo hahaha
Parabéns pelos seus conteúdos, são essenciais e é um prazer ler por aqui.